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Sistemas de Tratamento para Resíduos de Serviços de Saúde (RSS)

 

Relatório Técnico e de Viabilidade: Análise Exaustiva dos Sistemas de Tratamento para Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) no Brasil

Sumário Executivo

O gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) no Brasil é um desafio complexo e crítico, regido por um rigoroso arcabouço legal. Este relatório técnico analisa o panorama atual, aprofundando-se nas tecnologias de tratamento, na viabilidade econômica e nos impactos ambientais associados. A legislação, encabeçada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e pela RDC ANVISA nº 222/2018, transfere a responsabilidade integral pela destinação final ambientalmente adequada ao gerador, solidificando a terceirização para empresas especializadas como o modelo de negócio dominante.

As tecnologias de tratamento mais utilizadas, a incineração e a autoclavagem, apresentam perfis distintos. A incineração é altamente eficaz na destruição de patógenos e na redução de volume, mas enfrenta custos elevados, críticas sociais e o desafio da emissão de poluentes atmosféricos persistentes, como as dioxinas. Em contrapartida, a autoclavagem, que esteriliza por vapor, oferece um método mais econômico e de operação mais simples, embora não reduza o volume dos resíduos e exija a disposição posterior em aterros.

O custo total da gestão de RSS é multifacetado, com a mão de obra representando o componente mais significativo, superando os gastos com materiais e equipamentos. Isso sublinha a importância de um gerenciamento eficiente e da segregação na fonte como estratégias primárias para a redução de custos. Tecnologias emergentes, como o plasma térmico, e soluções de economia circular, como a digestão anaeróbia para resíduos orgânicos, despontam como tendências futuras que podem otimizar a gestão e mitigar os impactos ambientais, alinhando o setor de saúde às práticas de sustentabilidade global.

1. Introdução: A Complexidade do Gerenciamento de Resíduos de Saúde

1.1. Definição e Escopo dos Resíduos de Serviços de Saúde (RSS)

Os Resíduos de Serviços de Saúde (RSS), comumente referidos como lixo hospitalar, englobam todos os resíduos gerados em estabelecimentos cujas atividades estão diretamente ou indiretamente relacionadas à atenção à saúde humana ou animal.1 O escopo desses geradores é amplo e diversificado, incluindo não apenas hospitais, clínicas médicas e laboratórios, mas também consultórios odontológicos, funerárias, necrotérios, serviços de medicina legal, farmácias, drogarias e até mesmo estúdios de piercing e tatuagem.1 A correta gestão desses resíduos é considerada uma prática essencial, pois minimiza a produção de lixo, protege a saúde pública, a segurança dos trabalhadores e preserva o meio ambiente.1

No contexto brasileiro, embora os RSS representem uma pequena fração do volume total de lixo urbano, estimado entre 1% e 3%, o risco intrínseco que eles carregam é desproporcionalmente alto.6 Desse total, cerca de 10% a 25% são classificados como perigosos, o que justifica a necessidade de procedimentos especiais e um gerenciamento cuidadosamente planejado, desde a geração até a destinação final.6 A falha em tratar e eliminar esses resíduos de maneira adequada pode resultar na propagação de doenças infecciosas e na contaminação do solo e da água.1

2. O Marco Regulatório e a Classificação Brasileira de RSS

2.1. Normativas Federais e o Plano de Gerenciamento (PGRSS)

O gerenciamento de resíduos no Brasil é balizado pela Lei Federal nº 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).8 A PNRS estabeleceu uma hierarquia de prioridades que deve nortear a gestão de qualquer tipo de resíduo: a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem, o tratamento e, como última opção, a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos.10 No contexto dos RSS, a regulamentação técnica é pautada, principalmente, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).1 A Resolução CONAMA 358/2005 e, mais recentemente, a RDC ANVISA nº 222/2018, que revogou a antiga RDC 306/2004, são as normas atuais que disciplinam o setor.1

A RDC 222/2018 ratificou que todo estabelecimento gerador de RSS, seja público ou privado, é responsável pela elaboração, implantação e monitoramento de um Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS).14 Este documento técnico, que deve estar disponível para fiscalização dos órgãos competentes, descreve todas as ações relativas ao manejo dos resíduos, desde a sua geração até a destinação final.11 A legislação brasileira, em sua profundidade, estabelece que a responsabilidade do gerador não se encerra na porta do estabelecimento. A norma vigente assegura que a responsabilidade pelo descarte correto, que abrange a coleta, o transporte, o tratamento e a disposição final, continua sendo do gerador, mesmo quando essas etapas são terceirizadas.18 Essa abordagem visa garantir a segurança do processo até o final do ciclo, incentivando os geradores a contratarem empresas devidamente licenciadas pelos órgãos ambientais locais, como a CETESB em São Paulo.7 O não cumprimento dessas exigências pode acarretar em multas diárias significativas, o que eleva a escolha do parceiro logístico e de tratamento a uma decisão estratégica de alta criticidade.23 A rastreabilidade do resíduo é assegurada por meio de documentos como o Manifesto de Transporte de Resíduos (MTR).19

2.2. Classificação e Segregação na Fonte

O primeiro e mais fundamental passo para um gerenciamento eficiente é a correta classificação e segregação dos resíduos na fonte de geração.1 As resoluções RDC 222/2018 da ANVISA e CONAMA 358/2005 classificam os RSS em cinco grupos distintos, com base em suas características e riscos 1:

  • Grupo A (Potencialmente Infectantes): Resíduos com possível presença de agentes biológicos que, por suas características de virulência ou concentração, podem apresentar risco de infecção.25 Este grupo é subdividido em A1 a A5, dependendo do tipo de resíduo gerado.26 Exemplos incluem culturas de microrganismos (A1), bolsas de sangue contaminadas (A2), peças anatômicas (A3), sobras de amostras laboratoriais (A4) e materiais de assistência a pacientes (A5).14

  • Grupo B (Químicos): Resíduos que contêm substâncias químicas que podem apresentar risco à saúde pública ou ao meio ambiente.1

  • Grupo C (Radioativos): Quaisquer rejeitos que contenham radionuclídeos em quantidades que impliquem risco potencial.1

  • Grupo D (Comuns): Resíduos assemelhados aos resíduos domiciliares, que não apresentam risco biológico, químico ou radiológico.1

  • Grupo E (Perfurocortantes): Materiais que podem causar cortes ou perfurações, como agulhas, lâminas de bisturi e ampolas de vidro, que também podem estar contaminados com material infectante.1

A segregação é o princípio mais importante de um sistema de manejo eficiente.1 Ao separar corretamente os resíduos em seus grupos, os estabelecimentos garantem que o material perigoso receba o tratamento adequado, enquanto os resíduos comuns podem ser encaminhados para a coleta seletiva ou disposição em aterros sanitários convencionais, resultando em uma otimização de custos e uma redução do impacto ambiental.21

A Tabela 1 a seguir detalha a classificação dos Resíduos de Serviços de Saúde no Brasil, conforme a legislação vigente.

GrupoDescrição de RiscoExemplos de Resíduos
Grupo APotencialmente Infectantes: Resíduos com possível presença de agentes biológicos que apresentam risco de infecção.

Culturas e estoques de microrganismos (A1), resíduos com sangue (A2), resíduos de necrotérios (A3), sobras de amostras de laboratório (A4), órgãos e tecidos (A5), sobras de fluidos corpóreos.14

Grupo BQuímicos: Resíduos contendo substâncias químicas com potencial de risco à saúde pública ou ao meio ambiente.

Medicamentos vencidos, resíduos inflamáveis, reativos ou corrosivos.2

Grupo CRejeitos Radioativos: Materiais que contêm radionuclídeos e não podem ser reutilizados.

Rejeitos de laboratórios de análises clínicas, serviços de medicina nuclear, radioterapia.1

Grupo DComuns: Resíduos que não oferecem riscos biológicos, químicos ou radioativos.

Papéis de escritório, embalagens, restos de alimentos de áreas administrativas e de refeitórios.1

Grupo EPerfurocortantes: Objetos capazes de causar cortes ou perfurações.

Agulhas, escalpes, lâminas de bisturi, ampolas de vidro, lancetas.1

3. Tecnologias de Tratamento para Resíduos Infectantes (Grupo A)

3.1. Métodos Térmicos Convencionais

O tratamento dos resíduos infectantes (Grupo A) é uma etapa crucial antes da disposição final. No Brasil, os métodos térmicos mais comuns são a incineração e a autoclavagem.

Incineração

A incineração é um processo de queima controlada em fornos especializados, que operam em temperaturas que variam de 800 °C a 1.200 °C.32 A alta temperatura garante a destruição de patógenos e a eliminação de resíduos orgânicos e químicos perigosos.34 Uma das principais vantagens deste método é a significativa redução de volume, que pode chegar a 90% do material original.32

Apesar da eficácia, a incineração é a tecnologia mais custosa, podendo ser de duas a três vezes mais cara do que outros sistemas.34 O principal motivo de preocupação ambiental e social reside na emissão de substâncias tóxicas na atmosfera. Estudos científicos e ativistas ambientais, como o Greenpeace, apontam que a incineração pode gerar Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), como dioxinas e furanos.37 Esses compostos são altamente perigosos, bioacumulativos na cadeia alimentar e estão associados a sérios danos à saúde humana, incluindo o risco de câncer.39 Embora os incineradores modernos sejam equipados com sistemas de filtragem e lavagem de gases para minimizar essas emissões, a tecnologia ainda é vista como uma solução de alto custo que desconsidera riscos socioambientais em algumas análises.33 A incineração também produz cinzas e lodos que são classificados como resíduos perigosos e precisam de uma destinação final específica, geralmente em aterros especializados.28 A existência de propostas para proibir a incineração de resíduos sólidos no país 37 ilustra o debate em torno dessa tecnologia no Brasil.

Autoclavagem (Esterilização a Vapor)

A autoclavagem é um método de esterilização que utiliza calor úmido, ou seja, vapor saturado sob alta pressão, em uma câmara selada a temperaturas que variam entre 105 °C e 150 °C.4 A eficácia do processo se dá pela termocoagulação das proteínas citoplasmáticas dos microrganismos, destruindo-os de forma eficiente.4

As vantagens da autoclavagem incluem a alta eficiência na eliminação de microrganismos, a simplicidade de operação e um custo de aquisição significativamente menor em comparação com a incineração.34 Adicionalmente, o resíduo tratado é considerado estéril, podendo ser encaminhado para aterros sanitários comuns, o que, a longo prazo, pode representar uma economia substancial.28 Entre as desvantagens, a autoclavagem não reduz o volume dos resíduos, o que mantém a necessidade de espaço para armazenamento e transporte.34 O processo também exige o uso de bolsas e recipientes termo-resistentes, que têm um custo relativamente elevado, e não é considerado adequado para o tratamento de resíduos anatômicos, pois não os descaracteriza.34

3.2. Outras Tecnologias de Desinfecção

Tratamento por Micro-ondas

A tecnologia de micro-ondas consiste na utilização de ondas eletromagnéticas de alta frequência para a desinfecção de resíduos.46 Este processo é frequentemente combinado com uma etapa de trituração para aumentar a eficiência. Uma das principais vantagens do tratamento por micro-ondas é a redução da necessidade de grandes volumes de vapor, água e eletricidade, tornando-o um processo mais automatizado e potencialmente mais sustentável em comparação com a autoclavagem.46 Assim como a autoclavagem, o resíduo tratado pode ser triturado e encaminhado para aterros sanitários comuns após a desinfecção, o que representa um destino final ambientalmente adequado.

3.3. Tecnologias Emergentes e Sustentáveis

Plasma Térmico

Uma das tecnologias mais avançadas para o tratamento de resíduos perigosos é o plasma térmico.10 Este processo utiliza o plasma — o quarto estado da matéria, caracterizado por um gás parcial ou totalmente ionizado com temperaturas que podem atingir de 2.000 °C a 30.000 °C — para causar a dissociação das ligações moleculares dos resíduos.50 A tecnologia é capaz de destruir qualquer ligação química, transformando resíduos perigosos, como lixo hospitalar e cinzas de incineração, em substâncias mais simples e energia.10

O plasma térmico se diferencia por ser uma tecnologia "limpa, definitiva, segura e competitiva", que, em teoria, não gera outros resíduos perigosos.52 No entanto, a sua adoção no Brasil ainda é restrita a casos muito específicos.50 A ADESSO, por exemplo, é citada como uma empresa que opera uma planta de gaseificação de plasma no Rio de Janeiro, com capacidade para processar até 30 toneladas de resíduos por dia.50 A tecnologia, apesar de promissora, enfrenta barreiras de viabilidade econômica e de maturidade no mercado nacional, o que limita sua aplicação generalizada atualmente.50

Digestão Anaeróbia e Compostagem

A digestão anaeróbia e a compostagem são processos biológicos voltados para o tratamento de resíduos orgânicos, como sobras de alimentos de refeitórios hospitalares.53 A digestão anaeróbia transforma a matéria orgânica em biogás e biofertilizante, contribuindo para a geração de energia renovável e a reciclagem de nutrientes.55 A compostagem, por sua vez, é um processo aeróbico que converte resíduos orgânicos em um composto orgânico que pode ser usado para enriquecer o solo.56

A distinção entre resíduos biológicos (Grupo A) e resíduos orgânicos (Grupo D, como restos de comida) é crucial. Enquanto a incineração e a autoclavagem são indicadas para a fração infectante, a digestão anaeróbia e a compostagem são soluções para a fração orgânica, que representa uma parcela significativa do lixo hospitalar.56 Apesar do potencial, ainda existem poucas iniciativas de projetos de digestão anaeróbia para esse fim no Brasil.57 A falta de conhecimento da tecnologia e a descontinuidade política são citadas como barreiras para a sua adoção generalizada.57 No entanto, existem casos de sucesso, como o projeto do Hospital Regional do Cariri (CE) que, por meio da compostagem, conseguiu reciclar mais de uma tonelada de resíduos orgânicos, reduzindo o volume total de lixo e os custos de transporte.56

4. Viabilidade, Custos e Impactos: Uma Análise Comparativa

4.1. Aspectos Econômicos

A análise de viabilidade econômica do gerenciamento de RSS vai muito além do custo da tecnologia de tratamento em si. Embora a incineração seja conhecida por exigir um elevado investimento inicial e custos operacionais altos, devido ao consumo de combustível e manutenção 34, a autoclavagem é considerada uma opção mais competitiva e viável, com um custo inicial mais baixo.44 No entanto, um estudo de caso em um hospital público de São Paulo revela que o maior componente de custo no manejo dos RSS é a mão de obra, representando 91,59% do total, seguida pela depreciação (6,19%) e materiais de consumo.64 Esse dado, corroborado por estudos semelhantes, demonstra que a otimização dos custos não reside apenas na escolha da tecnologia, mas também na eficiência de todo o processo logístico e de gestão.64

A Tabela 2 compara as principais tecnologias de tratamento para resíduos infectantes, destacando suas características de viabilidade e impacto.

TecnologiaPrincípio de FuncionamentoVantagensDesvantagensCusto
Autoclavagem

Esterilização por vapor saturado sob alta pressão (105-150°C).4

Alta eficiência de esterilização, simplicidade de operação, custo de aquisição menor, resíduo final estéril que pode ser descartado em aterro comum.4

Não reduz o volume, exige recipientes especiais, não é adequada para resíduos anatômicos.34

Aquisição e operação relativamente baixas, mas o custo de materiais consumíveis pode ser elevado.34

Incineração

Queima controlada em altas temperaturas (800-1200°C).32

Grande redução de volume (até 90%), destruição de patógenos, pode tratar resíduos químicos.32

Alto custo de aquisição e operação, alto consumo de combustível, risco de emissão de poluentes atmosféricos (dioxinas/furanos), produz cinzas perigosas.34

Custo total duas ou três vezes maior que outros sistemas.34

Micro-ondas

Desinfecção por ondas eletromagnéticas de alta frequência, frequentemente após trituração.46

Requer menos vapor e água do que a autoclavagem, processo automatizado, ambientalmente amigável.46

Desvantagens similares à autoclavagem, sem redução significativa de volume.45

Redução de custos operacionais comparado à incineração.48

Plasma Térmico

Dissociação molecular por gás ionizado a temperaturas extremas (2.000-30.000°C).49

Solução definitiva e segura, destrói ligações químicas, não gera resíduos secundários perigosos.52

Tecnologia avançada, alto custo, ainda de nicho e com viabilidade limitada no Brasil.10

Alto investimento inicial.40

A Tabela 3, baseada em dados de estudos de caso, ilustra a composição dos custos de gerenciamento de RSS, reforçando a predominância da mão de obra.

Componente de CustoRepresentatividade (%)
Mão de Obra

91,59% 64

Depreciação

6,19% 64

Materiais de Consumo

Não especificado, mas menor que os dois anteriores 64

4.2. Aspectos Ambientais e de Sustentabilidade

A PNRS estabeleceu uma clara hierarquia de prioridades, na qual a disposição final em aterros é a última alternativa.10 Nesse contexto, a escolha da tecnologia de tratamento de RSS tem implicações ambientais diretas. A incineração, apesar de sua eficácia, é criticada pela geração de gases tóxicos, como dioxinas e furanos, que contribuem para a poluição do ar e se acumulam na cadeia alimentar, além de produzir cinzas perigosas que requerem aterros específicos.37 Por outro lado, a autoclavagem não gera poluentes atmosféricos, mas produz um efluente líquido que necessita de tratamento posterior.41

O conceito de economia circular, que propõe um ciclo contínuo de uso, reuso e reprocessamento, está ganhando relevância no setor de saúde.68 A incineração representa uma solução para o modelo linear (extração-uso-descarte), enquanto tecnologias como a digestão anaeróbia e a compostagem representam uma aplicação concreta da economia circular. Ao transformar resíduos orgânicos em biogás e fertilizante, essas tecnologias fecham o ciclo de nutrientes e reduzem a pressão sobre aterros sanitários.53 A esterilização e o reprocessamento de dispositivos médicos, uma prática crescente no setor, são outros exemplos de como a economia circular está sendo aplicada para reduzir o consumo de matérias-primas e os custos operacionais.68

5. O Mercado Brasileiro e Estudos de Caso

5.1. Principais Empresas e Modelos de Negócio

No Brasil, o modelo de gestão dominante para RSS é a terceirização completa para empresas especializadas. Companhias como a Cetes Ambiental, a Cril Soluções Ambientais, a Loga e a Ecourbis Ambiental oferecem serviços que abrangem desde a coleta e o transporte até o tratamento e a destinação final dos resíduos.5 A escolha dessas empresas deve ser baseada na sua especialização e no devido licenciamento ambiental, um pré-requisito para o cumprimento da responsabilidade legal do gerador.7 A Loga e a Ecourbis, por exemplo, operam sob concessão na cidade de São Paulo, atendendo a regiões específicas e seguindo rigorosas normas municipais e federais.22

5.2. Exemplos de Projetos e Iniciativas no Brasil

A implementação da gestão de RSS em hospitais brasileiros demonstra a complexidade e a necessidade de planejamento. O Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (Hupaa/Ufal/Ebserh) elaborou um Plano de Gerenciamento de Resíduos (PGRSS) alinhado à PNRS e à RDC 222/2018, focando na segregação na fonte como forma de otimizar todas as etapas do manejo.11

No âmbito da economia circular, o Brasil tem dado passos em direção a tecnologias mais sustentáveis. O município de Bertioga (SP) e a Usina de Biogás do Caju (RJ) são exemplos de projetos de digestão anaeróbia que convertem resíduos orgânicos em biogás e energia.27 Outra iniciativa notável é a do Hospital Regional do Cariri (CE), que implementou a compostagem para tratar resíduos de seu setor de Nutrição, demonstrando a viabilidade de transformar lixo em recurso, reduzindo o volume de resíduos orgânicos e os custos de transporte e destinação.56

6. Conclusão e Perspectivas Futuras

6.1. Síntese da Análise

O gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde no Brasil é um campo de atuação técnico-científica altamente especializado, com um arcabouço normativo robusto que coloca a responsabilidade pela totalidade do processo sobre o gerador. A incineração e a autoclavagem são as tecnologias dominantes para o tratamento de resíduos infectantes, cada uma com um perfil de custo-benefício e de impacto ambiental distinto. O modelo de terceirização para empresas especializadas é a via mais comum para o cumprimento das obrigações legais, uma vez que a mão de obra especializada e a infraestrutura necessária representam a maior parte dos custos totais.

6.2. Recomendações Estratégicas

Com base na análise, recomendações estratégicas podem ser formuladas para os principais atores do setor:

  • Para Geradores de RSS: É fundamental priorizar a segregação na fonte como a principal ferramenta para a otimização de custos e a mitigação de riscos. A escolha de um parceiro de gestão de resíduos deve ir além do preço, considerando a conformidade legal, a transparência do processo e o licenciamento ambiental da empresa em todas as etapas, desde a coleta até a destinação final.

  • Para Investidores e Desenvolvedores de Tecnologia: Oportunidades significativas podem ser encontradas em soluções alinhadas à economia circular, como a digestão anaeróbia e a compostagem para a fração orgânica dos RSS. Tecnologias de nicho como o plasma térmico, embora de alto custo inicial, podem se tornar viáveis no longo prazo para o tratamento de resíduos de alta periculosidade, especialmente se os regulamentos ambientais se tornarem mais rigorosos em relação a emissões.

  • Para Reguladores e Órgãos de Fiscalização: É crucial fortalecer a fiscalização e a aplicação das normas para garantir que a cadeia de custódia dos resíduos seja segura e transparente. O incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento de novas tecnologias que integrem os princípios da PNRS e da economia circular também é um passo estratégico para o futuro do setor.

6.3. O Futuro do Gerenciamento de RSS no Brasil

A tendência do setor de gerenciamento de RSS no Brasil aponta para um futuro de maior integração e sustentabilidade. Em vez de uma única solução para todos os resíduos, o futuro likely envolverá a combinação de diferentes tecnologias: a autoclavagem para resíduos infectantes, a digestão anaeróbia para resíduos orgânicos de cozinha e a incineração ou plasma térmico para frações químicas e farmacêuticas. A aplicação efetiva da PNRS continuará a redefinir o setor, incentivando a minimização da geração de resíduos e a transformação de lixo em recurso, alinhando a saúde pública e a proteção ambiental a um novo modelo econômico.

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